Escrita Tribal

segunda-feira, maio 09, 2005

Acreditar...

Quando não se acredita em nada, (ou se acredita em tudo) a vida é um mar de relatividades, onde nadamos frequentemente fora de pé. Acreditar em algo não implica inflexibilidade e fanatismo. Em cada pessoa pode existir um cientista ou um rato de laboratório. Acreditar não é partir de um preconceito e acreditar sem provas, mas dar tempo suficiente à crença para que se possa conhecê-la e estudá-la. Mas claro, para isso é necessário acreditar sinceramente na possibilidade da crença.

O laboratório é sempre o mesmo - o mundo. A experiência também - chama-se vida, e compreende-se num intervalo entre o que parece ser inexistência ou eternidade (ambas desafiam as noções de espaço-tempo portanto são semelhantes). A diferença entre o cientista e o rato é simples: o cientista controla a experiência, ou tenta pelo menos compreendê-la. O rato é a cobaia da vida, sofre as experiências geralmente sem perceber bem o que aconteceu, porque aconteceu, e se sobreviver continua a ser objecto da vida, sem tirar conclusões daí.

Fora da metáfora, os ratos e os cientistas são pessoas semelhantes... à primeira vista. Ambos podem aparentar-se calmos ou excêntricos, mas por razões diferentes. A diferença está na abordagem (da vida, claro):

No universo dos calmos, existem as que parecem calmas mas cuja mente fervilha de palavras, observam tudo com um olhar curioso, astuto, procuram aprendizagens e fazem associações e teorias de tudo. A qualquer momento a experiência pode tomar um rumo diferente e ensinar algo de novo, e mesmo quando se vai de A a D, pode-se fazer um desvio por B ou C, ou quem sabe ir além do D. Tentam aprender com tudo, para se munirem do máximo de conhecimentos possível que lhes possam ser úteis (ou seja, todos). Não são sociais (por falta de necessidade), mantêm-se focados nas suas observações e teorias, mas podem-se encontrar com outros para ocasionais trocas de informação. Não mudam de atitude conforme o dia ou a noite.

Há os calmos, de olhar vago e vazio, no chão ou no horizonte, que caminham de A a B, não observam nada de especial, ou se calha observarem pouca relevância pessoal terá, evitam pensar para não se distrairem (não vão perder-se antes de chegar ao B). O que lhes vai na mente é diverso, e nada terá a ver com o local onde se encontram ou com a experiência que estão a "sofrer", porque eles estão em todo o lado menos onde estão. As suas mentes estão reservadas para os sonhos diurnos, que normalmente lá ficam, porque passam a vida a caminhar de A para B. Frequentemente se encontram a caminhar de A' para B' julgando que se trata de C para D. Encontram-se frequentemente rodeados de outros semelhantes, movimentando-se em grupo para os mesmos destinos e fazendo companhia uns aos outros. Podem manifestar comportamentos opostos de dia e de noite.

Entre os excêntricos há os verdadeiramente loucos, que vivem intencionalmente a experiência da loucura, tentando recolher o máximo de informações e vivências possível. Não vão de A para B, mas podem estar no L e ir para K ou M, J, P, F, etc... Manifestam grande inteligência quando abrem a boca para algo mais que parvoíces, surpreendendo os demais. Não são muito sociais nem é do seu interesse ser porque assim podem manter a distância necessária ao seu estudo. Entretêm-se e estudam os outros, enquanto os outros julgam que estão a ser entretidos. Sabem que são loucos sem necessidade de exercer loucuras para se afirmarem como são, pois a loucura sai-lhes naturalmente. O que dizem não é geralmente levado a sério, pois "são loucos"... Não mudam de atitude conforme o dia ou a noite (mudam de atitude várias vezes durante o dia e várias vezes durante a noite).

Existem também os excêntricos que querem ser excêntricos porque nas suas loucuras sentem-se integrados com outros excêntricos semelhantes. Geralmente não concluem grande coisa das suas loucuras (nem era essa a sua intenção). Também não vão de A a B, mas vão de A a D enquanto isso os mantiver entretidos (regressando sempre ao A no final). Quando o percurso de A a D se tornar demasiado banal e deixar de ser "loucura", saltam para E e recomeçam uma repetição entre E e H (voltando ao E no final). Movimentam-se em grupo e juntam-se para executarem as suas loucuras, formando sub-grupos sociais de gente "diferente". Frequentemente dizem coisas inteligentes, características no seu grupo de excêntricos, fascinando e atraindo os próximos e ganhando credibilidade, mas ocasionalmente manifestando estranhas "falhas" nas seus afirmações, podendo causar desconfiança temporária. Não mudam realmente de atitude conforme o dia ou a noite (apesar de ocasionalmente poderem dar essa impressão).

Nota: Verifica-se que um cientista calmo pode mutar para um cientista excêntrico (e vice-versa), durante períodos relativamente longos de tempo. Da mesma forma os ratos podem efectuar mutações de calmos grupais para excêntricos grupais, chegando-se a verificar essa mutação e re-mutação no espaço de uma semana ou até num mesmo dia.

1 Comments:

  • Parabéns pela analogia, muito bom.
    Fiquei a pensar a qual deles me corresponderia.. ficou a duvida.
    **keep the good workin'

    By Blogger M., at 11:26 da tarde  

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